Al Di Lá

Você se lembra do filme Candelabro Italiano?

sábado, 22 de outubro de 2011

Meus Tipos

Hoje, lendo Thiago de Mello, mais precisamente o livro A Lenda da Rosa, dei com os costados num poema e dele transcrevo um excerto: ... – E para sempre – entre os homens,/ a sina do amor é dar-se/ inteiro e cada vez mais/ reflorindo de si mesmo,/ para florescer no além,/ não importa que esse amor/ seja abraçado ou magoado./ Nenhum amor é perdido. Ora!, vô e vó, pai e mãe, filhos, irmã(o)s, namorada(o)s, companheira(o)s, amiga(o)s, todos fazem parte desse rol de amores que tocam e embelezam a nossa vida. No geral, temos todos, alguém que amamos, que nos ama; que amamos e não nos ama e, sabe-se que existe, e disso não temos culpa, alguém que nos ama e nós nem sabemos... Enfim, o tema é atraente e triste dependendo do tipo, do gênero, da espécie – sabe-se lá se o amor tem tipo, espécie ou gênero ... Mas, aqui e agora, como dizia aquele famoso guru da nossa geração, o Aldous Huxley,na sua A Ilha, me vem à lembrança três figuras pitorescas que tenho quase certeza, não conheceram o amor. Nós, os velhos do aqui e agora, ainda trazemos nas retinas cansadas as figuras pitorescas da Madinha, do Alvim Caminhão e do João Barbela. Todos chamavam a nossa atenção por terem parecenças. Coisas em comum, muitas coisas em comum, até. Nenhuma delas foi vista um dia com um alguém. Nenhuma sabia ler ou escrever e, quando se comunicavam, não íam além da construção de frases com quatro ou cinco palavras. Nem conseguiam entabular uma conversa que passasse de duas frases e, neste caso, nenhuma delas com sujeito e predicado. A primeira figura morava com o casal da Dona Celina e o Seu Idílio. Ele era cobrador de mensalidades dos nossos clubes sociais e sua mulher lavava roupa de moradores prósperos. A Madinha era a entregadora das roupas e, neste afazer, com muitas trouxas de roupa equilibradas na cabeça atravessou a cidade. Baixinha, calada, alegre e sempre sorrindo, talvez por não ter tido inteligência suficiente para dar um bom-dia ou um cumprimento, por mais simples que fosse. E todos a cumprimentavam à passagem que era sempre pelo meio da rua, nunca pelas calçadas. Outra figura, com características quase idênticas: o Seu Alvim, que era maleiro na Estação Rodoviária e entregador de encomendas. Poucas palavras faziam parte do seu vocabulário, tinha uma imensa dificuldade na construção de frases e perguntava ou respondia aos interlocutores através de monossílabos. Dele já falamos quando traçamos um pequeno perfil e o seu relacionamento com a comunidade. Dificilmente pelas calçadas. Sempre o meio da rua... Outra figura foi a do João Barbela. Tinha ele uma pequena carroça com rodas de ferro e a usava para fazer pequenos carretos, carregando lenha, malas - quando eram muitas e o Seu Alvim não dava conta -, enfim, coisas como comprar e revender garrafas vazias em depósitos de bebidas para receber uma changa. Lembro que o calçado comum deles eram sapatos velhos que usavam em forma de chinelos, sempre maiores que os pés, acalcanhados, rotos. Ainda, por coincidência maior, nunca se viu um deles sequer, entrar em casa por uma porta da frente. Sempre, intermitentemente, às chegadas ou saídas, faziam uso dos portões das suas casas. A Madinha, entrava e saía por um portão que havia no terreno da casa do Seu Idílio, na Rua Gomercindo Saraiva, sítio onde vivia esta família que a acolhera. O Seu Alvim entrava e saía na residência que o acolhia por um portão que dava entrada de serviço ao Hotel do seu Chico Bonneau, pela Rua Visconde de Mauá, hoje avenida. E, por fim, sempre entrando e saindo por um portão, junto com a sua carrocinha, o João Barbela, que morava com o Seu Marcelino, proprietário da Fármácia Maciel. O portão ficava na Rua Zeca Maciel, defronte à Liga Operária. O portão sempre foi uma tônica na vida destes que eu chamo carinhosamente de Meus Tipos e que povoam a minha lembrança. Quem lembra deles? Teriam eles amado alguém? Foram amados? Chegaram a se declarar a alguém? Viveram e morreram com algum amor incubado. Ah! Falem baixinho... Se forem falar de amor... Aqui deste alpendre, lá ao oeste, no encordoado das coxilhas, o sol cai nos braços da noite. A Madinha, o Alvim e o Barbela nunca caíram nos braços de ninguém? Nem nunca amaram?

Nenhum comentário:

Visitantes

Marcadores