Al Di Lá

Você se lembra do filme Candelabro Italiano?

domingo, 27 de abril de 2008

Borracheira

Tempos atrás, quando a nossa Arroio Grande era bem menor, o lixo era retirado das ruas por carroças puxadas a burros. Para este trabalho a Prefeitura mantinha os animais tratados e alimentados pelos próprios funcionários lixeiros, dos quais, hoje, lembro a figura miúda do seu Loretinho. Invariavelmente, mal iniciada a coleta, o veículo do Seu Loretinho, que era muito pequeno, enchia e logo tinha de ser descarregado num aterro, perto do arroio, lá para os lados do Perau. Certo dia, quando a Dona Isabel Dutra fazia limpeza no pátio do seu Sobradão, não querendo esperar pela carrocinha do lixo, contratou o Feliz Peru, pessoa pitoresca da cidade, para puxar os entulhos num carro-de-mão. Quando o carrinho fazia ainda a primeira carga e o Feliz Peru estava prontinho para partir, a Dona Isabel pediu que ele desse uma acomodada na carga, para esvaziar um vidro com butiás, usados num curtido com canha. Ajeitada a carga, com os butiás bem em cima, o Feliz tomou o rumo do arroio. Já ao dobrar a rua ele passou a mão num dos butiás, deu uma mastigada e gostou. Gostou tanto, tanto, que butiá após butiá, tocou com o carrinho rumo a sua casa, destino bem distinto do lixão, onde deveria descarregar o entulho. Morava naqueles umbus grandes que existem até hoje na entrada da Ponte Velha. Chegando em casa, no seu peculiar caminhar de dez pras duas, nem deu assunto para os de casa, só encostou o carrinho numa raiz de umbu. As Peruas, como também eram chamadas as suas duas irmãs, donas-de-casa, assistiram à chegada do irmão e ficaram esperando no que ia dar, acostumadas que estavam com as cenas que ele patrocinava, permeando biscates com trago de caninha. Mas, vai daí, a limpeza no pátio aumentava o entulho e o Feliz Peru que havia feito apenas uma carga não voltava com o carrinho. Saíram à procura. Primeiro no arroio das mulheres, depois no Perau, onde a Prefeitura fazia aterro. Nada de Feliz, nada de carro-de-mão. Até que tiveram a idéia de ir onde ele morava. Foi tiro dado, jacu deitado. Entre as altas raízes dum dos umbus, com o carrinho cheio de lixo, ainda, e rodeado de carocinhos de butiás descarnados, dormia em plácida borracheira o Feliz Peru. Dormia como guri pequeno.

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