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segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Meus Tipos

Meus Tipos
Poucos guardam na lembrança a grande amizade que unia o Castelhano Gabriel e o Padre Neves. Figuras que fazem parte do meu imaginário como uma das coisas mais gratas que guardo.
Amigos inseparáveis o Castelhano e o padre desde as memoráveis pescarias semanais até o joga-fora de assuntos aos fins de tarde. Além, é claro, do testemunho que o sacerdote carregava das memoráveis bebedeiras do Gabriel. Tratavam-se como compadres que eram. Era compadre prá cá e compadre prá lá.
Não era raro o castelhano, sem olhar para o amigo, fazer uma pergunta começando com um tratamento mais reverencial: - Seu Padre..., e começava a indagação de uma simploriedade qualquer em que a resposta sempre vinha acompanhada da indulgência do interlocutor... Dir-se-ia que o clérigo elegera a oficina mecânica do Gabriel como seu refúgio das agruras existenciais. Nos frequentadores da oficina tinha o padre o rol de pessoas simples que lhe faziam companhia e casavam com a sua humildade. O Padre Neves, ou Padre Análio, foi uma das pessoas mais marcantes que nasceu por estas paragens.
Moço ainda, tendo ido para o seminário, de lá voltou formado como o primeiro padre nascido em nossa cidade. Verdadeiramente ele era uma figura impar a viver em um meio agreste culturalmente. Por aqui, os letrados de plantão hostilizavam-no por suas ideias de cunho extremamente avançadas, já que trazia, com uma anterioridade surpreendente, tudo aquilo que é pregado atualmente pelo Padre Leonardo na sua Teoria da libertação.
Mas, deixemos destas delongas para tratar da fiel amizade destes meus dois tipos. Lembrar as pescarias que eles temperavam de forma sublime: o Padre, com suas linhas e o Gabriel com sua inseparável caninha da marca Brasa (depois de sair do mercado a famosa cachaça de nome Atitude, que fez furor tempos antes). Padre Análio com seu jipe ano cinquenta e quatro, americano, de cor verde, daqueles que sobraram da Guerra da Coreia e vieram abastecer o mercado brasileiro e o Castelhano Gabriel com suas fubicas.
Na oficina nasciam as pescarias nos açudes do município, nas Três Bocas do Bretanhas, ou na Barra, na Costa do Arroio... Além do padre e do castelhano faziam parte como comparsas o Seu Idalino, lá do Herval, que vinha sempre no seu jipe americano, de capô alto. Fazia parte da confraria, também, o João Carpinteiro, sempre quietão, abstêmio. Tinha o Nei do Abílio, moleque que comparecia para os mandaletes no acampamento. Tudo sempre rolando a Brasa do castelhano misturada com mel.
Que vida... Tudo numa grande amizade, com muita conversa, bastante peixe, que naquela época havia abundância e muita graça patrocinada pelo Gabriel e sua irreverência desmedida, folclórica, até.
Pode-se dizer que o castelhano era a espinha dorsal do grupo. Toda a graça partia dele e seu conluio com a indispensável caninha Brasa. Brasa com mel. Eram pescarias para ninguém botar defeito. Principalmente quando o castelhano fazia questionamentos ao Padre Neves.
E o vinho do Padre Análio que suscitava curiosidade no Gabriel? Certa vez, o Padre, distraído com uma traíra beliscando na linha, não viu o castelhano dar um talagaço no vinho dentro da canequinha de alumínio, daquelas que milico usa no quartel: - Compadre, este meu vinho desceu uma barbaridade... – Fui eu Seu Padre. Eu queria ver se ele era forte como a minha Brasa...
Um dia, todos sentados numa barranca e o castelhano, já á meia-guampa, arriscou uma pergunta: - Seu padre, eu tenho uma coisa comigo que inquieta a minha cabeça. Se o compadre não se ofender eu vou perguntar. Posso? Silêncio da turma. Vinha chumbo grosso, turbinado pela Brasa com mel... E o Gabriel soltou a pergunta: – Compadre, vigário fode? Silêncio sepulcral... O Seu Idalino, olhando para o Padre Neves, envergonhadíssimo, dado o respeito que nutria pelo amigo religioso, chamou a atenção do castelhano: - Mas Gabriel, que comportamento é esse? Em ato contínuo, o Padre Análio, com uma bondade infinita, desconversou: Não reparem, não... O compadre é assim mesmo, ele é engraçado quando toma Brasa com mel. Ele diverte a gente. Faz parte da natureza dele...








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